
Cartaz utilizado para a estreia comercial em Portugal.

O realizador Fernando Lopes com um exemplar do cartaz como fundo. Fonte.

Fotografia de Belarmino Fragoso utilizada no cartaz, que surge também nos créditos iniciais do filme.

Cartonado do filme. Imagem gentilmente cedida por Rui Poças.

Belarmino Fragoso na capa do nº1 da revista "PLANO I", dedicada a "Belarmino" de Fernando Lopes e ao Cinema Novo Português (Março 1965). Fonte
Belarmino (1964)
O retrato de um antigo lutador de boxe, Belarmino Fragoso, através das suas deambulações por uma Lisboa que já não existe. A solidão, o medo e a derrota cruzam-se num filme que baralha o documentário, a ficção e a entrevista, num passeio por antigas salas de cinema e clubes nocturnos.
Primeira longa-metragem de Fernando Lopes, com o apuro ‘jazzistico’ de Manuel Jorge Veloso e a brilhante fotografia de Augusto Cabrita, este é um dos filmes-chave do Cinema Novo Português.
realizador
Fernando Lopes
designer
Sebastião Rodrigues
assinado
não
data
Novembro 1964
impressor
Bertrand (Irmãos), Ld.ª
tiragem
500 exemplares
dimensões
68 cm X 100 cm
ator no cartaz
Belarmino Fragoso
n.º de entrada
015
sobre o cartaz
Em entrevista a Carmo Lopes, o produtor António da Cunha Telles atribuiu a autoria do cartaz a Sebastião Rodrigues, sendo o seu único cartaz de cinema conhecido:
“Para esse [cartaz] fui ao atelier do Sebastião Rodrigues, juntamente com o Fernando Lopes. Numa rua que sai do Teatro Tivoli. Era um grande gráfico. A fotografia deve ter sido o Augusto Cabrita. Tinha sido o operador de fotografia principal do filme, era um grande fotógrafo. Trabalhei com ele lado a lado no fim dos anos 50, fazendo reportagens para a RTP” (2017, p. 256).
Em termos de composição, o cartaz encontra-se dividido ao meio: na metade superior foram colocados os elementos textuais e na metade inferior uma fotografia de Belarmino, existindo um diálogo entre ambas. Do ponto de vista da tipografia, é interessante a repetição do título do filme, uma vez que sugere a ideia de cânticos ou saudações do público, dos tempos áureos em que Belarmino brilhava nos rinques de Lisboa.
Por outro lado, a expressão cerrada (resignada?) do protagonista parece indiciar um certo ‘peso’ associado ao seu próprio nome, ou às memórias que ele acarreta: se em tempos foi (a)clamado pelas multidões, aquando da gravação do documentário era já desconhecido de muitos. No mundo do espetáculo e do desporto sempre existiram estrelas tão grandes que dispensavam a utilização de um apelido para as identificar – no final dos anos 50 só existia em Lisboa um Belarmino, e é essa ideia de nostalgia e tristeza latentes que o título do filme e o cartaz parecem evocar.
A sobreposição do bloco de créditos, em Akizdenz-Grotesk a vermelho, sobre o título do filme (supõe-se que em Elegance Grotesk, condensado) constituiu uma opção gráfica inédita no universo dos cartazes de cinema, mas em consonância com o cunho autoral de Sebastião Rodrigues, não comprometendo a legibilidade dos elementos. Pela riqueza simbólica e modernidade gráfica da composição, pode considerar-se este um dos cartazes deste período que melhor dialoga com o respectivo filme e que simultaneamente anuncia uma nova maneira de fazer cinema (e cartazes de cinema) em Portugal.
Não sendo o primeiro cartaz de cinema onde é a fotografia é utilizada, constitui um dos primeiros exemplos de como o designer, neste caso Sebastião Rodrigues, se apropria dela e a reveste – através da disposição dos elementos no espaço da folha – de um novo significado, criando um diálogo entre os dois Belarminos: o homem que o documentário encontra, no presente, e a evocação do seu glorioso e fugaz passado como boxeur.
Por último, destaque para o genérico inicial do filme, com autoria de Mário Neves, que conjugou fotografias do protagonista, capturadas pela lente de Augusto Cabrita, e as apresentou numa ritmada sequência, pautada por diversas perspetivas e níveis de proximidade a Belarmino do decorrer da sua rotina diária. Ao som da música jazz, os elementos tipográficos vão surgindo, organizados em blocos de texto cuidadosamente alinhados e integrados com as imagens, resultando num genérico que revela dinamismo e uma assinalável modernidade gráfica.